Um dos “eternos” temas de discussão que ao longo dos tempos se vai colocando é o facto de os homens e as mulheres serem diferentes! Mas ao longo deste meu trabalho fui colocando algumas indagações…
Pensamos e agimos de forma diferente? Será que os homens são melhores em algumas atividades e as mulheres noutras? E porquê? Será que alguma vez nos vamos entender e compreender? Onde está afinal a origem da nossa diferença… será biológico ou cultural? É biológico o comportamento “imoral”, como por exemplo a traição? Reagiremos como “animais ou como referia Descartes como seres pensantes?
No sentido de responder a estas e outras questões imiscuí-me neste tema de uma forma profunda para obter respostas sobre como vemos estas questões no nosso cérebro.
Nós somos seres biológicos e por isso, e citando o meu estimado amigo Pedro Camargo (2011), algumas abordagens do marketing, por exemplo não fazem sentido para mim, como o facto de se investigarem comportamentos de consumidores por questionários, entrevistas, quando na realidade entre 80% e 95% dos nossos comportamentos são inconscientes. É na biologia que residem as respostas.
Sabemos que o nosso encéfalo decide em cerca de 4 milisegundos ao passo que qualquer processamento dito racional demora cerca de 500 milisegundos, sabemos também que temos uma tendência natural para a mentira e o auto-engano, arquivamos memórias erradas (como escrevi no artigo anterior), temos cerca de 100 biliões de neurónios, onde cada um faz entre 1000 a 10000 ligações a outros neurónios, onde as permutações e combinações em cada cérebro excede o número de partículas no universo, o nosso cérebro como os restantes sistemas actua sobre as leis da física, partilhamos 98,9% dos nossos genes com os chimpazés, cerca de 95% com os ratos, 60% com os frangos, 50% com os vermes e 25% com todos os seres vivos… tendo em conta isto, porque assumimos que existem diferenças noutros orgãos (pulmonares, reprodutivos, entre outros), e não aceitamos que somos diferentes no cérebro?
Tudo começa no processo hormonal, em que as mulheres, por terem 2 cromossomas XX em que o segundo não é tão silencioso como se pensa, como refere Livernois et al. (2011) num artigo publicado recentemente na Nature (artigo) onde as diferenças entre géneros são delineadas a partir do 8º mês de gestação… até essa data, como diz Camargo (2011), todos temos um cérebro feminino, a partir daí, uma descarga de testosterona faz com que exista a diferenciação neuronal gerada pelo cromossoma Y. Mas o facto de o cérebro feminino ter aptidão para cores e diferenciação minuciosa de estímulos visuais, deve-se precisamente ao facto do cromossoma X determinar a diversidade das células fotoreceptoras, sendo por isso as mulheres mais sensíveis à cor que os homens.
Os homens e as mulheres sintetizam as moléculas de forma diferente, por exemplo nos ácidos gordos (Decsi & Kenedy, 2011), num outro estudo (Bin et al., 2010) mostra (como podemos ver na imagem) que o cérebro da mulher é mais denso que o do homem, explicando talvez o seu peso mais elevado na idade adulta, o que também explica um maior número de ligações e a utilização simultânea dos dois hemisférios tendo uma melhor capacidade de priming, enquanto que o homem tende a usar apenas um (Van Dike et al. 2009)
Quanto à linguagem, pensamos ser uma evolução natural. Quando são crianças, tanto homens como mulheres têm índices de linguagem idênticos (Wong et al., 2011), mas cedo começam a existir mudanças… Num estudo recente de Xie et al. (2011), publicado no Journal of Child Neurology, identificou-se que a idade é um importante predictor de volume do tronco cerebral e do tálamo, ou seja, enquanto que o tamanho do tronco cerebral aumenta com a idade, o volume do tálamo diminui. Porém, o lado esquerdo do tálamo (e matéria cinzenta) é maior nas raparigas, ao passo que os rapazes têm maiores troncos cerebrais. O tálamo maior está associado a um maior QI verbal. Num outro estudo de Schlaepfer et al. (1995) realizado com ressonância magnética funcional, observou-se que as mulheres apresentam um volume superior (23,2%) no córtex préfrontal dorsolateral – área de Broca e (12,8%) no giro temporal superior – área de Wernike, não se passando o mesmo nas regiões corticais visuoespaciais. Isto denota a superioridade notória das mulheres para a linguagem e a sua necessidade de falar.
Num outro estudo de Koles et al. (2010), além de reafirmar a capacidade notória das mulheres em desafios verbais e na verbalização interpretativa, ao passo que existe uma vantagem masculina em desafios espaciais e de orientação, assim como na verbalização consequente, ativando estruturas diferentes e com ordem diferente, como nos mostra a imagem.
Outra vertente muito importante deve-se à fase mestrual que influencia muito a decisão e os processos de decisão em si. Por exemplo, de acordo com o estudo de Weis et al. (2008), os homens possuem uma assimetria funcional cerebral estável ao passo que nas mulheres esta assimetria, devido ao aumento do estradiol geram uma alteração, tornando o hemisfério que era não-dominante em dominante. Assim, este estudo encontrou fundamentos que durante a fase folicular, devido ao aumento dos níveis de estradiol, a inibição e essas assimetrias funcionais eram reduzidas. Estes resultados mostram que o estradiol é um forte neuromodulador na dinâmica funcional do cérebro. Também é devido a esta hormona que as mulheres se sentem mais bonitas e atraentes na fase menstrual, aumentando a autoestima. Esta substância pode ser aumentada com o consumo de cerejas, papaia, maçãs, cenouras, tomates ou azeitonas, que são alimentos ricos em estradiol.
Mas será a testosterona outro neuromodulador que muda o cérebro masculino? Neste estudo de Pfannkuche, Bouma & Groothuis (2009), descobriu-se que a lateralização hemisférica é um princípio fundamental na organização cerebral dos vertebrados. Neste estudo encontraram-se diferenças sexuais no direccionamento da lateralização e na direcção por estimulação da testosterona.
Porém, num estudo de Haut & Barch (2006) demonstrou-se não existirem alterações significativas no processo de memorização, mostrando ambos os géneros um padrão de activação lateralizada em tarefas de reconhecimento e memória de trabalho. Como mostra a imagem, as zonas a amarelo representam regiões onde a actividade era superior para as palavras e a azul para as faces, demonstrando que o lado direito da imagem “viaja” para o lado direito do cérebro e o lado esquerdo da imagem “viaja” para o lado esquerdo do cérebro, mostrando assim que as estratégias de associação de marcas a curto prazo podem ser idênticas para ambos os géneros.
E a música? Será que processamos a música de forma diferente? Num estudo de Koelsch et al. (2003), mostra que os homens parecem ter um maior controlo esquerdo na linguagem, ao passo que as mulheres tendem a usar os dois hemisférios. Porém na música, os resultados deste estudo sugerem que a sintáctica musical é processada bilateralmente nas mulheres e com predominância no hemisfério direito nos homens, sugerindo que o processo auditivo não está apenas restrito ao processo de domínio linguístico, mas também ao processo sintático, semântico e fonológico. Por isso a música pode ter efeitos diferenciadores em homens e mulheres, podendo mesmo ter mais efeito sobre o homem.
Ora bem… já demonstramos que na linguagem as mulheres são notoriamente superiores, mas e na matemática? Num estudo de Frederikse et al. (1999), demonstra-se que existe uma região no córtex chamado de lobo infero-parietal (LIP) que é significativamente maior nos homens do que nas mulheres. Essa área é bilateral e localizada logo acima do nível das orelhas (córtex parietal) e está correlacionado com as capacidades mentais em matemática (como curiosidade, era enorme no cérebro de Einstein). Porém, de acordo com os dados da NSF (2007), as mulheres representam apenas 20% nos TOP’s de Matemática nas Universidades e Centros de Investigação dos estados Unidos (Lehrer, 2011), o que pode indicar baixo desenvolvimento desta área. Porém, esta é uma área que é “neuroplástica”, ou seja, sofre mutações. Num estudo interessante de Davies et al., (2010), afirma que os anúncios de TV restringem as mulheres académica e profissionalmente… poderá isto mudar o desenvolvimento desta zona? Outro estudo, refere que os esteriótipos afectam a performance feminina na matemática (Spencer et al. 1998), onde o facto de ter professores de matemática masculinos diminui a performance das alunas… então ter professoras de Matemática é a cura!!! 🙂
Mas a questão só começa a ganhar interesse quando falamos da reacção sexual… são os homens mais propensos à traição? Será a traição uma acção ou uma reacção? Bem, num estudo de Swaab et al. (2001) e noutro estudo do mesmo autor de 1995, mostram que existem diferenças no hipotálamo que podem coordenar a orientação sexual e o comportamento diferente do ponto de vista sexual de homens heterosexuais, mulheres e homens homossexuais. Porém este estudo, publicado na Science por Levay (1991) mostra que o volume de um núcleo específico do hipotálamo (no núcleo intersticial do hipotálamo inferior) é duas vezes maior em homens heterossexuais do que nas mulheres e nos homossexuais. Explica a feminidade de alguns homens e as diferenças sexuais entre géneros? Será que por este motivo os homens têm mais tendência à traição? Será que os homens vêm o sexo de uma forma diferente, mais animal que as mulheres, que a vêm mais como afectos? As evidências apontam para aí…
Até os campos de visão somos diferentes, como mostra a imagem acima, o homem tem uma visão mais focal, ao passo que a mulher é muito mais periférica. Num estudo conduzido por Brabyn et al. (2005) sobre a capacidade de conduzir à noite, mostra que as homens têm menos aptidão para conduzir á noite que as mulheres que têm mais células fotoreceptoras. Esta explicação tem surgido por diversas formas, a mais aceite deve-se ao facto de filogeneticamente as mulheres serem recolectoras e os homens serem caçadores, logo precisam de visão mais focal… ora experimentem encostar-se a uma parede com os braços esticados e tentem ver as duas mãos ao mesmo tempo… homens é difícil, não??
Bom… tudo isto nos leva a concluir que somos diferentes, mas ao mesmo tempo iguais em direitos! Eu sou um defensor acérrimo dos ideais da revolução francesa: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Mas somos diferentes… e porque queremos ser iguais, quando a desigualdade é inevitável? Um estudo brilhante publicado na Nature por Tricomi et al. (2010) atribuem este sentimento de desigualdade aos processos neuronais de recompensa percebida. Neste estudo encontraram-se evidências em Ressonância Magnética Funcional que avalia a desigualdade mostrando a ativação de estruturas no striatum ventral e no córtex préfrontal ventromedial, duas áreas muito associadas aos sistemas de recompensa primários e à atribuição de valor financeiro. Tudo tem a ver com a sensação de recompensa, quando uns sentem mais recompensa do que outros…
Assim, pugnar pela Liberdade é deixar que Homens e Mulheres sejam diferentes, quando o querem e devem ser; Fraternidade é apoiar essas diferenças pois são elas que nos unem; e Igualdade é perceber a diferença… partilhando as recompensas, não as financeiras apenas, mas as de mérito, as de percepção da diferença de papeis que têm relevâncias iguais, sem mais-valias!
Somos diferentes… e não devemos querer ser iguais… mas essa é a piada! Como consumidores, queremos diferente… gostamos de coisas diferentes, é verdade que os homens não se apercebem dos 2cm de cabelo que as mulheres cortaram, nem da mala nova, é verdade que os homens não podem ver um “rabo de saia” que os olhos perseguem… é a nossa biologia… mas também nos conseguimos orientar melhor, caçamos melhor, defendemos melhor e fazemos melhores cálculos… Já viram que em conjunto, Homem e Mulher são o complemento para a perfeição? Eu sei que custa ao homem assumir, mas a mulher é uma máquina mais complexa… menos precisa, mas mais complexa! Por isso também são mais insatisfeitas, por causa dos seus sistemas de dopamina… é preciso surpreender SEMPRE uma mulher! É preciso muito cuidado com o pormenor… e mulheres, é verdade que os homens gostam de fazer muitas coisas infantis… isso treina a precisão (os jogos), gostam de tecnologia e de coisas inovadoras, por causa do seu lobo frontal menos desenvolvido!
Mas iremos compreender-nos de facto? Iremos aceitar-nos nas diferenças dos nossos géneros? Eu penso que não… pois depois perdia a “piada”! Deixo-vos com mais uma comichão mental para poderemos entender melhor o que está dentro da nossa caixa negra!!!
Meu querido, que somos diferentes e que nunca seremos iguais já o sabemos. Que certamente há explicações genéticas e biológicas também. Há imensos estudos com resultados diferentes entre si e daí resulta muita polémica. Mas não esquecer a influência da educação, da apreendizagem e da cultura.
(Para rir) A natureza fez-nos “mais perfeitas” porque temos a indescritível missão de sermos mães, daí sermos mais resistentes e trabalharmos com ambas as partes do cérebro. Por outro lado, dizem que os artistas, fazem primeiro um esboço e só depois a obra prima, logo como Deus fez primeiro o homem ….
Quanto à matemática, que sempre adorei, só tive no passado estudantil um homem à “minha altura”, por isso não sei, não sei… Que fique claro que não sou homem!
Bj
Lídia
Mais uma prova, tese científica, de que devemos dar lugar ao princípio da igualdade no respeito das diferenças.
Bernardo Couto
É na diferença que está a beleza, a felicidade e o sentido da vida….!!
Olá Fernando, só um pequeno acréscimo… Não é o cromossoma Y que determina o género, é um gene específico, o SRY, que, por força das circunstâncias, se encontra localizado no cromossoma Y. Mas isto não é taxativo…
Por vezes, antes da fecundação, por um fenómeno chamado crossing-over que decorre durante a meiose que originará os espermatozóides no progenitor, esse gene pode “saltar de cromossoma” (estamos a falar do par XY das células-mãe dos espermatozóides, convém lembrar) i.e, sai do cromossoma “Y” e “cola-se” ao cromossoma “X” e aí temos no final, um belo par de espermatozóides constituídos cada um por 22+X e 22+Y cromossomas (23 por célula, certo?) prontos para fecundar um oócito! Mas… repare bem: o espermatozóide que transporta o cromossoma X possui agora o gene SRY… (irá gerar um embrião masculino apesar de o par determinante de género deste pequeno ser em formação ser XX!) e o espermatózoide que transporta o cromossoma Y (o tal que perdeu o gene SRY) irá gerar um embrião feminino (!) apesar de, genotipicamente, o embrião, depois feto e depois criança (and so on…) ser XY…
Podemos assim concluir que, por defeito (i.e., na ausência do gene SRY) sendo XX ou sendo XY (sem o SRY), é-se mulher. Se for XX com o gene SRY, é um indivíduo do sexo masculino. Todavia, não há bela sem senão: em ambos os casos, (mulher XY ou homem XX) os sujeitos são estéreis…
Mas isto é apenas a explicação de uma bióloga, ao ritmo dos ciclos circadianos.
(Por vezes é preciso partir alguma pedra para se chegar à verdade 😉
Isabel
Muito bem… Obrigado Isabel pelo contributo que ajuda a limpar as asperezas e aperfeiçoa este artigo!
De facto eu não tenho um domínio tão grande da genética como a Isabel, sendo este contributo uma mais valia muito interessante!
Muito obrigado!